(Toots Thielemans, dele, "Old friend")
lá vai a vida a rodar"
(Ferreira Gullar)
por lugares distantes viajava,
longe, muito longe de minha casa,
sobre trilhos de aço laminado,
sem que eu pudesse me dar conta de sua passagem.
Neste blog publico textos a respeito de livros e artigos que leio, cenas do cotidiano que observo, pensamentos que tenho, e matérias que me fazem sentir que merecem ser relembradas ou relidas de tempos em tempos.
"Quando vejo uma luz que ninguém vê
E me sinto só, não sei por quê
Corro, vou pelo campo procurar
Lá tenho um amigo pra contar (...)"
(Paulinho Nogueira)
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https://www.youtube.com/watch?v=YOCmmft5TQI
Foi no quintal de nossa casa que ela quis morar.
Fez sombras, ficou forte, deu
frutos, cresceu: cresci com ela.
Testemunhou, por muitos anos, o caldeirão com leite em cima do muro:
Presente diário do fazendeiro-amigo, vizinho de fundo.
Contente com tão boa vizinhança, a
mangueira buscou o céu,
Cresceu mais, fez mais sombras, deu mais frutos, deu pouso a pássaros.
Acompanhou a família nas festas e reuniões
Que aconteciam no fundo do quintal.
O tempo passou; nosso vizinho se foi, novos vizinhos
vieram.
Feito braços de boas-vindas,
nossa mangueira estendeu seus galhos, cruzou o muro.
Passou a presentear o novo morador com suas
folhas e seus frutos.
Avessa à demarcação de limites,
a mangueira ainda prolongou suas raízes por baixo do muro,
manifestou seu desejo de promover boa vizinhança,
e anunciou que fronteiras não devem imperar entre bons confrontantes.
Os novos vizinhos, incapazes de entender o significado de tais gestos,
Instalaram no muro cercas de arame eletrificado.
Tocadas pelas folhas e pelos frutos da
mangueira,
um alarme passou a soar escandalosamente em ouvidos vigilantes.
Partindo do outro lado do muro, a queixa e o pedido logo chegaram:
"Frondosa e alta, a mangueira incomoda;
Suas folhas e seus frutos esbarram no
arame,
fazem disparar o alarme: eliminá-la é a solução."
Infrutíferas as negociações, o quintal ficou triste:
Sem a árvore, sem as sombras, sem os
frutos, sem os pássaros.
Sobre o muro, fios enrolados exaltam campos de concentração -e seus idealizadores:
Mas a minha mangueira, indestrutível, permanece comigo.