Neste blog publico textos a respeito de livros e artigos que leio, cenas do cotidiano que observo, pensamentos que tenho, e matérias que me fazem sentir que merecem ser relembradas ou relidas de tempos em tempos.
Foto: publicada na página Olympics, do facebook, postada em 23/01/24
para o Rui
Na abertura das Olimpíadas de Paris, o rio Sena foi a "avenida" pela qual desfilaram as delegações dos diversos países participantes. As ruas, as avenidas e os grandes rios foram, ao longo do tempo, e continuam sendo, os locais onde acontecem grandes desfiles cívicos, religiosos, comemorativos... e também muitas manifestações políticas.
Por caminhos batidos por animais, procurando trajetos mais curtos, desviando dos incômodos do calor do sol, dos acidentes do relevo, os homens vão se locomovendo, fazendo nascer ruas que, inicialmente estreitas e sinuosas, dentro de um povoado, são o embrião das grandes avenidas das cidades. De forma análoga, dos pequenos cursos de água, córregos, riachos, regatos, ribeirões, os rios. Assim, por ruas e avenidas, riachos e rios, vamos nos deslocando no espaço público.
"Fado Tropical" - Chico/Ruy Guerra
https://www.youtube.com/watch?v=NfjaFMah7sE
Depois de ter assistido à abertura das Olimpíadas, e depois de ter lido alguns comentários a esse respeito, fiquei imaginando muitas impossibilidades que poderiam até fazer algum observador sensato duvidar da minha sanidade... O curso dos rios, o traçado das ruas… sonhando estar em um pequeno barco, acompanhando o fluxo das águas… do Sena ao Thames, cruzando o Canal da Mancha no mesmo barco; seguindo ao sabor dos ventos até o Danúbio, da Floresta Negra até o Mar Morto… depois até o Reno, navegando dos Alpes até o Mar do Norte… por fim encontrando o Tejo… que, em trajetória inversa à cantada no "Fado Tropical" (Chico/Ruy Guerra), “numa pororoca, depois de cruzar o Atlântico, deságua no Rio Amazonas…”. Do Rio Amazonas, descendo pelo Tapajós, Araguaia, São Francisco, por rios riachos e corredeiras... pelo Paranaíba, pelo Rio Grande... num barquinho muito valente, em "dias de luz, festa de sol”, encontro-me no Rio Pardo... E sigo remando, remando... até que o Pardo, de alguma forma, encontre o Sapucaí. Daí, plantada às suas margens, a cidadezinha… a Cachoeira do Yamaguchi… o pequeno rancho… onde, por tantas vezes, deitado preguiçosamente no chão, olhava o céu… até adormecer de cansaço… sonhando navegar, um dia, pelas águas do Rio Sena…
Émile Louis Picault (1833-1915) foi um artista francês, famoso por esculpir guerreiros, heróis, personagens históricos e mitológicos. Foi muito prolífico. Dentre seus inúmeros trabalhos, no ano de 1890 esculpiu em bronze o primeiro líder bárbaro que uniu grupos, com chefes tribais diversos, em torno do governo de um único rei - com reinado transmitido a seus herdeiros. Esse líder, Clóvis, que viveu de 466 a 511, o primeiro rei dos francos, é considerado o fundador da França - e da sua primeira Dinastia (a Merovíngia).
"Clóvis, o guerreiro", peça esculpida em bronze em 1890, encontrava-se no Palácio dos Arcos - e, posteriormente, no Palácio Monroe (sedes sucessivas do Senado brasileiro), na cidade do Rio de Janeiro. Com a transferência da capital para Brasília, a peça "Clóvis, o guerreiro" passou a pertencer ao Museu do Senado Federal - onde pode ser vista.
Não se sabe como a peça chegou ao Senado, no Rio. Ninguém sabe. Eu também não sei. Só sei que, em visita recente ao Museu do Senado, indiretamente pude me afastar no tempo para poder parabenizar o escultor E. Picault pela sua obra, e tocar suas mãos supostamente calejadas, por conexão possibilitada pelo bronze de superfície perfeita esculpido em rei.
Presidentes do Senado, no Império - Museu do Senado
(CLIQUE NA SETA PARA OUVIR ENQUANTO LÊ) ("Oblivion" - Astor Piazzolla)
https://www.youtube.com/watch?v=dF-IMQzd_Jo
"A vida é suficientemente longa,
e com generosidade nos foi dada
para a realização das maiores coisas
se a empregamos bem."
(Sêneca)
No espaço aéreo da cidade grande, enclausurado no apartamento onde vivo, fico olhando o lustre no teto.
("O lustre" - foto: arq. pessoal)
Do teto às janelas; delas, às janelas dos prédios vizinhos. Algumas delas abertas, porém sem nenhum sinal de vida. As horas que se vão passando carregam consigo a sensação angustiante de desperdício de tempo.
Qualquer ruído, qualquer som, alguma voz que eventualmente ouvisse poderia me servir de estímulo para alguma busca. Nada ouço, porém. De súbito o acionamento de uma válvula de descarga de algum apartamento do prédio e o fluxo de água pela tubulação dão sinais de vida. Esses barulhos distantes, quase imperceptíveis, preenchem tanto o meu vazio quanto o meu silêncio. Penso no casal que vive no apartamento imediatamente acima do meu. Octogenários aposentados desde longa data, ele, médico neurologista, ela professora de piano. Nunca os visitei. Nas poucas vezes que nos vimos no elevador nós nos cumprimentamos e sorrimos. Quando penso neles eu os imagino sentados em suas poltronas, um ao lado do outro, esperando, quase adormecidos. Moram sós. Não tiveram filhos.
O barulho de água fluindo pela tubulação acendeu-me o desejo de levar a eles a possibilidade de um pensamento bom, a lembrança de um momento feliz. Instintivamente vou buscar minha caixinha de som, abro a janela da sala, e com o aparelho suspenso pelas minhas mãos para o lado de fora aciono a tecla PLAY. Retiro das profundezas do esquecimento o bandoneon do Astor Piazzolla. Quero que o suspiro de seu fole encha de vida os pulmões viventes no apartamento dos meus vizinhos. Desejo imensamente que eles consigam ouvir a música que, pensando neles, pus para tocar; desejo que, ao ouvi-la, seus corações se aqueçam; que, despertando de seu suave cochilo, animem-se em dizer um ao outro: "alguém ouve música". Que sorriam diante da simplicidade dessa ideia, que estendam as mãos um para o outro, e com toques de carinho relembrem histórias de amor que ficaram guardadas nas gavetas do tempo.
*Oblivion - (do inglês) esquecimento, adormecimento, abandono.
Ontem passei pela Nove... e, imaginando preservado o calçamento da Avenida, fiquei angustiado ao pensar em suas margens esquecidas em um tempo futuro, distante do meu período de existência... margens tomadas por prédios retos, frios, práticos, altos e impessoais... prédios espremidos construídos onde, um dia, havia existido um prédio diferenciado, um espaço para confraternização - um clube recreativo - às margens da Avenida.
A Recreativa conta uma... muitas... inúmeras histórias da cidade e de sua gente: histórias de sonhos, lutas e sacrifícios, que ensejaram a formação de laços de amizade e companheirismo entre muitas pessoas.
A sua sede social, na Av. Nove de Julho, é um prédio e espaço diferenciado? É! Tem valor cultural? Se tem!!! A começar pelos murais feitos nas paredes ao lado da calçada... Internamente, as suas piscinas... as quadras de tênis, o restaurante, os salões de festas, o ginásio de esportes... no coração de Ribeirão Preto: um belo cartão postal da cidade... da cidade que se enriquece, que se transforma... mas que - quero crer - saberá preservar e manter de pé suas referências...
Mural na Av. Nove de Julho, à entrada da Recra (Foto: acervo pessoal, maio/24)
Mural na Av. Nove de Julho, à entrada da Recra (foto: acervo pessoal, maio/24)
Mural na Av. Nove de Julho, à entrada da Recra (Foto: acervo pessoal, maio/24)
Mural na Av. Nove de Julho, à entrada da Recra (Foto: acervo pessoal, maio/24)
Mural na Av. Nove de Julho, à entrada da Recra (Foto: acervo pessoal, maio/24)
Dante Alighieri - Portrait of Dante (1495, Sandro Botticelli)
https://pt.wikipedia.org/wiki/Dante_Alighieri
No exato sentido do termo, conforme costumava empregar minha avó quando queria dizer "hábil, esperto", o Dante Alighieri (1265-1321) foi "danado" mesmo: dispôs o inferno, o purgatório e o paraíso, em "A Divina Comédia"*, em estruturas e camadas: creio que ele, ao fazer essa montagem, inspirou-se nas muitas pessoas que haviam passado e que ainda estavam passando pela sua vida. E fez tudo isso com muita arte. Certamente ele também olhou para si mesmo, e tentou se situar naquelas camadas. Fiquei também tentando me situar: em qual estrutura estaria eu? em qual camada? No paraíso não me vi, posto que ando muito humanizado; no inferno, fiquei até com um certo receio de refletir sobre os diversos estágios, mas definitivamente as entidades não devem ter chegado ao consenso de que eu deva ficar por lá, correndo de um lado para outro sem parar, como forma de pagamento pelas minhas omissões e infrações… Mas ainda guardo uma certa esperança de me purificar: assim, em havendo esperança, o inferno, por enquanto, não parece ser o meu destino. Tentei me enxergar no purgatório, e penso que tenho zanzado pelos seus estágios, procurando me purificar, e mantendo uma certa esperança de atingir o paraíso. Assim, ainda nesse embate pela purificação, vou ficando por aqui, mantendo vontade e empenho para me tornar cada vez menos imperfeito.
Interlúdio (órgão) - Basílica de São Pedro - 2016
https://www.youtube.com/watch?v=FWXXm34R3HQ
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*A Divina Comédia (originalmente "Comédia") - foi escrito de 1304 a 1321.
Depois de algum tempo voltei aos treinos noturnos de natação. Treinando, movimentando o corpo, vou cuidando de mim, quieto, em silêncio. Dentro d'água sou alvo de uma série de questões que, sem saber de onde vêm, ficam borbulhando em minha mente.
Astor Piazzolla - "Libertango"
https://www.youtube.com/watch?v=vaXNdVTGT0k
Voltei à piscina para poder atravessar as sombras e o reflexo das luzes que incidem no bailado das águas; voltei para acompanhar a corrida dos azulejos no fundo da piscina... para poder ficar calado, observando... Batendo os braços e as pernas, em silêncio, as ideias vão brotando das águas... E vou respirando... pensando... 25 metros... 50 metros... braços alongados... "João do Rio e Lima Barreto nutriam, um pelo outro, uma grande inimizade... preciso estudar melhor a respeito..."... Respiro... indo e voltando... batendo as pernas de forma ritmada... 200 metros... "as postagens politicas e inoportunas no meu grupo whatsapp de amigos vão promover chateação e mágoas... devo dizer algo?"... 300 metros... batendo as pernas... pensando... "o administrador, antes de ter se manifestado, não ouviu a comunidade... expressou unicamente seu entendimento pessoal... Maquiavel já havia comentado a respeito... o egoísmo, a ânsia pelo poder..."... Mãos em concha... 400 metros... "a Lei de Emancipação, nos Estados Unidos, tampouco cuidou de criar uma política de inserção do negro na sociedade... mas... esse abismo social no Brasil..."... 500 metros... respiro.... "os líderes das grande potências não se manifestam com clareza em relação aos conflitos bélicos em curso pelo mundo... e tanta gente morrendo... os interesses políticos justificam a indiferença?"... Respiro... 600 metros... acelero os movimentos... "o diretor falou pelo grupo sem antes ter consultado os representados... não gostei... essa confusão é temerosa... por quê tanto tato para levantar a questão?"... 800 metros... respiro na borda da piscina... "há paralelos entre o sertão de Guimarães Rosa e o de Darcy Ribeiro?... preciso pesquisar..."... 1000 metros... Sigo nadando, cadenciadamente. Concentro-me nas batidas rítmicas de pernas, no giro dos braços... Respiro.
Dentro d'água todos os sons e movimentos exteriores se distanciam, são secundários, desinteressantes... Enquanto nado, mergulho nas questões que vão borbulhando sem que eu as formule... Com força, bato as pernas na água... vou girando os braços, dando braçadas... e me pergunto voluntariamente: "Será que as águas promovem essa corrente impetuosa de questões como forma de vingança pela agressão que imponho a elas?"
Já na borda da piscina, cansado, respiro devagar e elaboro uma pergunta simples vinda lá do fundo do estômago: "O que será que teremos em casa hoje, para o jantar?"... e saio da piscina sem nenhuma resposta...
O cinema é uma das formas de expressão artística que tem o poder e a magia de despertar diferentes sensações. Para isso, o gênero ou estilo de filme contam muito.
O filme noir é um desses "gêneros" - ou, discute-se, não de "gênero", mas de "estilo", pois muitos entendem tratar-se de uma maneira de lidar com a imagem. O filme noir, em geral, trabalha com suspenses psicológicos que adentram a personalidade humana. Nesse "gênero" (chamemos assim), ninguém é santo: todos são, em algum momento, suspeitos. Diferente do maniqueísmo que era filmado até então, quando se identificava muito bem quem era o bandido e quem era o mocinho, no filme noir mulheres já são tratadas sem aquele perfil exclusivo de ingenuidade; os vilões às vezes nem são tão maus; e detetives já não são tão confiáveis quanto deveriam ser. Em geral, os traços marcantes do filme noir são as sombras, os ângulos de filmagem, cenas com fumaça e neblina - e eu acrescentaria, ainda, que a música também exerce um papel fundamental, pois cria todo um clima de mistério e suspense. Casacão, chapéu e cigarro, com histórias ligadas ao chamado "whodunit", ou seja, que descrevem investigação, com assassinato, são elementos que compõem os filmes noir. Neles,há quase sempre um indivíduo com muitas manias - em geral é o detetive, com falas fortes e absolutas. Há ainda muita narração em off, que reflete a necessária economia do número de cenas para a época; vejo, inclusive, um certo machismo no filme noir... se bem que a mulher já aparece mudando o seu perfil social nesse período: ela carrega ainda uma certa fragilidade, porém começa a ser vista como autora de gestos nem sempre nobres, muitas vezes falível, elaborando tramas e buscando atingir intentos de uma forma nem sempre muito ética.
O filme noir teve sua fase áurea de 1941 a 1958, nos Estados Unidos. Foram realizados, no "gênero" noir, dentre muitos outros, os seguintes filmes: "O falcão maltês" (Relíquia macabra) - (1941), dirigido por John Huston; "Pacto de sangue" (1944), "Farrapo humano" (1945), e "Crepúsculo dos deuses" (1950), dirigidos por Billy Wilder; "Laura" - (1944), por Otto Preminger; "Gilda" (1946), por Charles Vidor; "A dama de Shangai" (1948), por Orson Welles.
Humphrey Bogart ("Relíquia macabra"), Rita Hayworth ("Gilda", "A dama de Shangai"), Dana Andrews ("Laura"), Glenn Ford ("Gilda"), Barbara Stanwyck ("Pacto de sangue"), Lauren Bacall (À beira do abismo"), são alguns dos atores e atrizes associados ao filme noir.
Apesar de serem muito pobres em locações e cenários, de mostrarem cenas "forçadas", tais como aquelas em que, exemplificativamente, detetives aparecem no apartamento de qualquer suspeito, sem qualquer anúncio prévio, para interrogá-lo sempre que assim desejam, gosto dos filmes noir... Acho especialmente interessantes os seus títulos, tão fortes e macabros que, só de me deparar com eles, já sinto um certo arrepio: "A curva do destino", "Alma torturada", "O homem dos olhos esbugalhados", "Assassinos", "O beijo da morte"...
"It's [never] too late" para falar da Carole King, do James Taylor e da Carly Simon - e do Paul Simon e do Cat Stevens, acrescento. "It's [never] too late" para me reorganizar e poder ouvir minhas playlists, com uma série de gravações marcantes que foram feitas por eles.
Carole King - "So far away" (Carole King) - do LP "Tapestry" (Epic, 1971)
https://www.youtube.com/watch?v=UofYl3dataU
O meu amigo "Big Boy", que, de tão romântico, acho que morreu de amores (por tudo e por todos), era proprietário de um fusca vermelho, ao qual apelidamos "tocha".
Nos finais das tardes de sábado o Big Boy estacionava o "tocha" na calçada do Bar do Vicente, na esquina da rua principal da nossa querida e minúscula cidade, e ali nós nos juntávamos em grupo de amigos, na calçada ao redor de uma mesa posta. E com as portas do "tocha" abertas, o Big Boy colocava para tocar uma fita k7 com as nossas gravações prediletas: "Wild world", "High out of time", "Tapestry", "That's the way I've always heard it should be", "Carolina on my mind", "Nobody does it better", "I haven't got time for the pain", "So far away"... "It's gonna take some time", "Embrace me, you child", "It's too late"... E de lá, da calçada do nosso fim de mundo, debaixo de uma árvore e das estrelas do céu, cantávamos e brindávamos com nossos queridos ídolos sem que eles, de algum lugar no mundo, tivessem conhecimento da maneira carinhosa que estavam sendo celebrados e que tocavam os nossos corações.
E nesse ambiente de música, conversa e bebida, como se já não houvesse comentado anteriormente inúmeras vezes, o Big Boy "filosofava":
- "Só de ouvir a voz da Carole King eu já tenho vontade de ir não sei pra onde.
E completava:
- "Vicente, traga mais cerveja aqui pra mesa... e, pra mim, mais um uísque caubói".
Com o pedido feito ao Vicente ele se levantava e entrava no "tocha", justificando sua movimentação:
- "Vou aumentar o som. Quem sabe, de algum lugar por aí, essa danada me escuta".
E a Carole King cantava:
- "So far away/ doesn't anybody stay in one place anymore/ it would be so fine to see/ your face at my door..."
E eu, perdido em meus pensamentos, ficava imaginando a Carole King sorrindo, atenta a cada comentário que íamos fazendo...
Os mariachis são grupos que cantam música folclórica mexicana. São alegres e muito sorridentes. Foram formados, inicialmente, para animar festas de casamento - por isso a origem da palavra: do francês "mariage", que significa "casamento". Dentre as músicas folclóricas mexicanas, gosto, especialmente, de Las Mañanitas - uma música que costumava ser cantada no México, nas festas de aniversário, no momento de se cortar o bolo - mas também logo de manhã, em forma de serenata, para aquele ou aquela que aniversariava.
Las Mañanitas - Mariachi Conce - (Vicente Fernàndez)
https://www.youtube.com/watch?v=BPgmyhHvkFs
Las Mañanitas
Estas son las mañanitas
Que cantaba el rey David
Hoy por ser día de tu santo
Te las cantamos aqui
Despierta, mi bien, despierta
Mira que ya amaneció
Ya los pajaritos cantan
La luna ya se metió
Qué linda está la mañana
En que vengo a saludarte
Venimos todos con gusto
Y placer a felicitarte
El día en que tú naciste
Nacieron todas las flores
En la pila del bautizo
Cantaron los Ruiseñores
Ya viene amaneciendo
Ya la luz del día nos dio
Levántate de mañana
Mira que ya amaneció
Si yo pudiera bajarte
Las estrellas y un lucero
Para poder demostrarte
Lo mucho que yo te quiero
Con jazmines y flores
Este día quiero adornar
Hoy por ser día de tu santo
Te venimos a cantar
As Manhãs
Estas são as manhãs
Que o rei Davi cantava
Hoje por ser dia do teu santo
Cantamos para ti
Acorda, meu bem, acorda
Olha que já amanheceu
Já os passarinhos cantam
A lua já entrou
Que linda esta manhã
Em que vim cumprimentar te
Viemos todos com prazer
E prazer em parabenizá-lo
O dia em que nasceste
Todas as flores nasceram
Na local onde está o batistério
Cantaram os rouxinóis
Já vem amanhecendo
Já a luz do dia nós dia
Levanta-te de manhã
Olha que já amanheceu
Se eu pudesse descer
As estrelas, e uma estrela
Para te poder provar
O quanto te amo
Com jasmins e flores
Este dia eu quero enfeitar
Hoje por ser dia do teu santo
Viemos cantar
Na letra de Las Mañanitas, há uma palavra que sempre cantei sem saber o seu significado. Mas hoje, especialmente, ao enviar meus cumprimentos de aniversário a um amigo que vive no México, encaminhei a ele, como ilustração, um vídeo de uma gravação de Las Mañanitas. E dessa vez bateu forte a vontade de conhecer a tal palavra.
A tal palavra está na quarta estrofe da canção. Nela o autor diz que, "no dia em que o aniversariante nasceu, todas as flores nasceram; que, no batistério, os 'ruiseñores' cantaram". Mas... "ruiseñores"... o que significa? Foi justamente ela que me levou a fazer uma pesquisa. Quem seriam esses "señores" que foram cantar no batistério? Seria um grupo de senhores chamados, todos eles, Rui? Não, não poderia ser. Isso seria uma tremenda bobagem!
No dicionário da Real Academia Espanhola, encontrei a seguinte explicação:
Ruiseñor - m. Ave canora del orden de las paseriformes, común en España y otras partes de Europa, de unos 16 cm de largo, con plumaje de color pardo rojizo, más oscuro en el lomo y la cabez que en la cola y el pecho, y gris claro en el vientre, que tiene pico fino, parduzco, y tarsos delgados y largos, y habita el las arboledas y lugares frescos y sombrios.
Como meus conhecimentos de ornitologia são mínimos, não consegui entender a explicação. Compreendi, no entanto, que tratava-se de uma ave. Mas... "uma ave comum na Espanha, de uns 16 centímetros, com plumagem da cor parda, mais escuro no dorso e na cabeça do que na cauda e no peito, e acinzentado no ventre, que tem bico fino, acastanhado, e as partes superiores do pé (tarso) delgadas e largas, e habita os bosques e lugares frescos e sombrios".
- Que ave seria essa? Você, meu caro leitor, saberia me dizer?
Bom, para ser mais direto, resolvi apelar para o dicionário Espanhol - Português:
"Ruiseñor (m.) - rouxinol".
Feliz com a descoberta, quase caí de costas de tanto rir da imagem que havia construído, ao pensar em uma porção de senhores sérios, todos eles chamados "Rui", cantando no batistério, no dia do ritual de purificação do aniversariante.
Pois é: "ruiseñores" significa "rouxinóis". Simples assim! E que bela descrição foi feita no dicionário da Real Academia Espanhola! Ao conhecer agora essa palavra da língua espanhola, senti a ressurreição imediata, aqui no meu local de trabalho, de um rouxinol que conviveu comigo na sala de visitas da casa de meus pais, por muitos e muitos anos. Esse rouxinol era amigo do imperador da China, morava nas páginas de um livro de contos de fadas do escritor dinamarquês Hans Christian Andersen, e também na narrativa gravada, desse mesmo conto, em um disco de vinil colorido que eu ouvia incansavelmente: "O Rouxinol do Imperador".
- E assim, juntando a pena do Milton Nascimento, vou agora convivendo com todos os meus rouxinóis: "Rouxinol tomou conta do meu viver (...) /Todos os pássaros, anjos dentro de nós/ uma harmonia trazida dos rouxinóis"*.
O Rouxinol do Imperador
https://www.youtube.com/watch?v=l8DzHrzMjFs
Adaptação e melodias: Elza Fiúza; Orquestração de Radamés Gnattali; Narradora: Sônia Barreto; Elenco Teatro Disquinho; ilustração: Joselito
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*início e refrão da canção "Rouxinóis" (Milton Nascimento), de seu álbum "Nascimento" (Warner, 1997)
"The singing butler" - Jack Vettriano, 1992 fonte: http://graphics8.nytimes.com/images/2006/02/23/arts/lyall2.650.jpg
Para o Tunico
Um amigo me escreve e diz que está cansado. Que dorme pouco; que seu cachorro late ao invés de fazer "festinha" quando ele chega em casa; que a namorada já nem mais pergunta se ele vai voltar cedo; que não teve tempo de visitar os filhos recém-nascidos dos amigos; que as olheiras estão enormes; que se arrasta pelas escadas do prédio onde mora; e, ainda, que tem de ouvir, com frequência, as pessoas lhe dizerem: "Que ressaca, hein?!?!"
E esse amigo me pergunta o que fazer.
Bom... claro que cada um tem sua receita. E, certamente, nenhuma é igual à outra.
Mas tudo isso só tem uma explicação: tempo, compromissos, responsabilidades, escolhas; vida.
A banda britânica "Supertramp" traduziu muito bem, em "The Logical Song", o ciclo da vida.
CLIQUE NA SETA PARA
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Supertramp - "The logical song" (1979)
https://www.youtube.com/watch?v=aiM_KW4RHek
The Logical Song
When I was young It seemed that life was so wonderful A miracle, oh it was beautiful, magical And all the birds in the trees Well they'd be singing so happily Oh, joyfully, playfully, watching me
But then they sent me away To teach me how to be sensible Logical, oh responsible, practical And they showed me a world Where I could be so dependable Clinical, intellectual, cynical
There are times when all the world's asleep The questions run too deep For such a simple man Won't you, please, please, tell me what we've learned I know it sounds absurd But please tell me who I am
Now watch what you say Or they'll be calling you a radical A liberal, oh fanatical, criminal Oh, won't you sign up your name We'd like to feel you're Acceptable, respectable, presentable, a vegetable
At night when all the world's asleep The questions run so deep For such a simple man Won't you please, please tell me what we've learned I know it sounds absurd But please tell me who I am Who I am, who I am, who I am
A Canção Lógica
Quando eu era jovem Parecia que a vida era tão maravilhosa Um milagre, era tão bonita, mágica E todos os pássaros nas árvores Estavam cantando tão felizes Alegres, brincalhões, me observando
Mas aí fui mandado para longe Para me ensinar a ser sensato Lógico, responsável, prático E me mostraram um mundo Onde eu poderia ser muito seguro Clínico, intelectual, cínico
Às vezes, quando todo o mundo dorme As perguntas se aprofundam Para um homem tão simples Por favor, me diga o que aprendemos Eu sei que soa absurdo Mas por favor me diga quem eu sou
Agora cuidado com o que você diz Ou eles vão te chamar de radical Um liberal, fanático, criminoso Oh, você não vai assinar seu nome? Gostaríamos de sentir que você é Adequado, respeitável, apresentável, um vegetal!
À noite, quando o mundo todo está adormecido As questões seguem muito profundas Para um homem tão simples Por favor, me diga o que aprendemos Eu sei que soa absurdo Mas por favor me diga quem sou eu Quem sou eu, quem sou eu, quem sou eu
Da minha parte, digo ao meu amigo que ele não é o único a fazer perguntas para se conhecer, para compreender o homem, e para reavaliar escolhas. Ainda bem que as faz.
Volta e meia somos todos tomados pela mesma necessidade de buscar respostas. Todos nós! Veja só a letra de "The logical song"! Ela não fala justamente disso?
Pensando no meu amigo, raciocino. Apesar dos pesares há sempre um outro lado para o qual precisamos olhar. Espero que ele o considere e que consiga dosar as porções das atividades escolhidas - na proporção que só a ele cabe definir. Acima de tudo, espero que ele não se esqueça de que o essencial nos é dado de graça. E ainda: que dance com alegria a canção natural da vida, fazendo com que tudo lhe valha à pena... Afinal, o meu amigo sempre soube fazer ótimas escolhas - e por isso sei que sua alma não é - nem nunca foi - pequena!
Hoje fui à praia. Entrei na água e fiquei brincando sob o sol, ao sabor das ondas.
clique na seta para ouvir
Maysa: "Nós e o mar" (Menescal/Bôscoli)
https://www.youtube.com/watch?v=USNFfujgbk8
Mas foi na areia, sentado à sombra de um guarda-sol, que fiquei observando os traços feitos pelo Criador: "quanta beleza; que perfeição!" Dei-me conta, inclusive, que Ele não se esqueceu de cuidar da arquitetura: abençoou o Niemeyer, que traçou linhas, muitas delas, inspiradas nas curvas e no relevo da mulher. "Ele [o Niemeyer] admirava a beleza e o corpo feminino. A mulher o inspirava" - conta seu ex-aluno e, depois colaborador, Salviano Guimarães*. O próprio Niemeyer, em "Poema da Curva", assim se explica:
POEMA DA CURVA
Não é o ângulo reto que me atrai.
Nem a linha reta, dura, inflexível,
criada pelo homem.
O que me atrai é a curva livre e
sensual. A curva que encontro nas
montanhas do meu país, no curso sinuoso
dos seus rios, nas nuvens do céu, no corpo
da mulher amada.
De curvas é feito todo o Universo.
O Universo curvo de Einstein.
Só sei que ao final do dia, já sob o luar, saí vagando pela orla à procura de um recanto pacífico onde eu pudesse fecundar o pensamento com taças de vinho, e ficar sonhando com o paraíso e com as deidades que um dia zanzaram pelo Olimpo.
Praia de Camburi, município de São Sebastião/SP, 29/12/2023
Sacha Distel e Dionne Warwick (e Baden Powell) - "The girl from Ipanema" / "A Felicidade"
https://www.youtube.com/watch?v=LsPJP_vJ2H4
foto em https://www.youtube.com/watch?v=LsPJP_vJ2H4
A Bossa Nova é o passaporte do Brasil, com o visto de entrada para qualquer país do mundo. E essa entrada é triunfal: leva sorrisos, leva gingado... leva sol, leva verde... leva tardes ensolaradas em "jardins de sol". E nessa praia há sempre "garotas de Ipanema": autênticas "flores que nascem morenas", e que inspiram beleza - e "(a) Felicidade". Quer mais? Pois a Bossa Nova é também o certificado de doçura da língua portuguesa falada no Brasil... que, quando soa, assim como passarinhos, tem o poder de um salvo-conduto, transpondo fronteiras, inclusive induzindo o estrangeiro a cantar e a assobiar, em instintiva elevação de alma. Com a Bossa Nova a "felicidade" não tem fim... em especial se se juntar acordes do violão do Baden a esse tempero, conforme fizeram o francês Sacha Distel e a norte-americana Dionne Warwick.
- Ah, Bossa Nova... Ah, Brasil... somos o paraíso adormecido... muito, muito mais do que se sabe por aí!