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terça-feira, 21 de setembro de 2021

A ASSEMBLEIA GERAL DA ONU

  

Assembleia Geral da ONU - 21/09/21
Foto: imagem transmitida pela CNN


    Quando o mundo se viu diante do holocausto, na Segunda Guerra Mundial, os líderes de 51 países reuniram-se em Chicago e fundaram a Organização das Nações Unidas - ONU.

    Antes disso, ao final da Primeira Guerra Mundial, em 1919, uma organização com o mesmo perfil da ONU havia sido criada: a Liga das Nações. Seu objetivo principal era tornar-se um fórum, onde representantes das nações participantes pudessem discutir e propor soluções diplomáticas e eficazes para a resolução de conflitos em todo o mundo. Porém, a Liga das Nações fracassou em seus propósitos. Por ausência de respaldo popular, inclusive, ela não conseguiu conter a deflagração de uma outra grande guerra: a Segunda. Assim que, pelo seu fracasso, a Liga das Nações foi substituída em seus propósitos pela Organização das Nações Unidas - a ONU.

    Fundada em 24/outubro/1945, a ONU tem por finalidade colocar-se como um centro de debates das grandes questões da humanidade, direcionando propósitos para a busca de soluções diplomáticas para eventuais conflitos, ou para evitar sua ocorrência.

    Questões, tais como as relações entre os países, os valores universais (paz, saúde, vida, segurança, alimento, liberdade, dignidade),  aquecimento global, fome, destruição de recursos naturais, conflitos pelos mais diversos motivos (armados ou não), corrupção, instabilidade política, escassez de água, poluição de rios, emissão de gases poluentes, enfim, problemas que afetam diretamente toda a humanidade, podem e devem ser discutidos de forma civilizada na ONU, de tal forma a se encontrar uma solução pacífica para afastá-los.

    Ontem, 21/09/21, em Nova Iorque, reuniu-se a Assembleia Geral da ONU. Pela televisão, vi e ouvi manifestações que me causaram desesperança. Percebi que há representantes de grandes nações que ainda não entenderam quais são os objetivos da ONU; que não sabem para quê devem fazer uso da palavra. Há líderes que foram à Assembleia Geral para, além de experimentarem da pizza nova-iorquina, comentarem exclusivamente sobre suas plantas e os seus jardins ressecados, sem se atentarem para o mundo, a partir de suas próprias janelas. Manifestando de tal forma, demonstraram que não sabem compreender que as suas águas, as suas flores, os seus perfumes e a sua gente, estão inseridos em um universo muito maior.  

    Ao ouvir ontem, na ONU, discursos e manifestações impertinentes e distantes do foco específico, sem (ao que parece) as devidas instruções dos agentes dos respectivos órgãos internos competentes (isso conseguiria conter impulsos de certos representantes?), fico pensando na pequenez humana dos que ainda não compreenderam que o problema de um, no contexto da ONU, é problema de todos.

    Pela continência formal, palmas para Biden.

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

"UNO"

 

"Uno" - Roberto Goyeneche
https://www.youtube.com/watch?v=Gf2BmOwMFlg

    Ninguém precisa se interessar pelos assuntos e manifestações que me interessam. Para quê, então, falar disso? Afinal, cada um tem seus próprios interesses.

    Acontece que, de vez em quando, a gente fica parado no meio do nada, e fica procurando se livrar de pensamentos que também nada acrescentam. Em assim sendo, acabo por dizer essa tremenda inutilidade: "gosto de tangos."

    Como diria minha amiga Cidinha, "pronto, falei!"

    - E daí?

    Bom. Gosto da “pegada” do tango, das “punhaladas” do bandoneón, das frases as vezes longas, às vezes curtas do violino, e do piano saltitante com pitadas de classe e determinação. O par, homem e mulher, garbosos e compenetrados... os passos, avanços e recuos, miradas de canto de olho... vestido longo com abertura lateral... sensualidade...

    Canto mentalmente um trecho do tango "Uno": 

    - “uno busca lleno de esperanzas el camino que los sueños prometieron a sus ansias... “.

    Penso:

    O Manuel Bandeira precisou que seus pulmões, um dia, se transformassem em foles de bandoneón. E eu sinto que os meus, nesse instante, precisam passar por essa mesma transformação.

    - Um tango... e mais um.... e outro.... e todos os tangos.... para que a respiração atinja a perfeição!


Pneumotórax
(Manuel Bandeira)

Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico:

— Diga trinta e três.
— Trinta e três… trinta e três… trinta e três…
— Respire.

— O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
— Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
— Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

sexta-feira, 17 de setembro de 2021

MEU DEGRAU CATIVO, NO CAMPO DA ASSOCIAÇÃO


Estádio Arthur Alves dos Santos - Portão de entrada
Foto: acervo pessoal

    Nunca fui bom de bola. Nem médio. Eu era, digamos, abaixo da média...

Música tema Canal 100 - "Na cadência do samba" - Waldir Calmon
https://www.youtube.com/watch?v=5uCPo6p97Pw&t=69s

  Mas nos treinos de futebol dos heróis da cidade de Guará, eu jogava! Bom... a bem da verdade, de vez em quando deixavam que eu jogasse - no gol. Penso que eram muito generosos comigo - os grandes atletas que treinavam no "Artur Alves dos Santos". Eles sabiam mostrar, no gramado, o que era ser guaraense, guerreiro, vencedor. E eu me sentia orgulhoso quando conseguia preencher, nos treinos, alguma vaga que surgia no gol - do time "B".

    Nas tardes de domingo, quando aconteciam as grandes batalhas dos nossos heróis contra fervorosos "inimigos" das cidades da região, era sentado no meu degrau cativo da escadaria que levava às chamadas “cabines de rádio”, lá de cima, ao lado do seu Ivã Aleixo - o seu Ivã alfaiate -, que eu acompanhava as partidas de futebol e ficava olhando a bola rolar em campo... ou procurando entender o desenho formado pelas nuvens no céu... no céu que nos emantava de azul e branco, no campo de futebol da Associação - o Estádio Arthur Alves dos Santos... 

Sr. Ivã Aleixo (Ivã Alfaiate)
Foto (detalhe): acervo Dr. Romeu

sábado, 11 de setembro de 2021

O BRASIL DO JOÃO GILBERTO E O MEU

 

Tarsila do Amaral - "O mamoeiro" (1925)
https://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra1623/o-mamoeiro


A música, com o João, é o retrato primoroso de um país pacificado.

O Brasil do João é simples, é dócil, é perfeito; 
o Brasil do João é garboso, é alegre, é vencedor; 
o Brasil do João é afável, é carinhoso, é encantador. 

O Brasil da voz e do violão do João Gilberto é a mais perfeita representação da delicadeza que anda esquecida; é onde tem morada a semente da solidariedade. 

O Brasil do João é o país no qual eu quero viver.

Rita Lee e João Gilberto - "Brasil com S" (Rita Lee e Roberto de Carvalho)

sexta-feira, 10 de setembro de 2021

FERREIRA GULLAR: OS ANOS DE EXÍLIO

     (escrito em 05/janeiro/2013)

(Capa do livro "Rabo de Foguete- os anos de exílio" - fonte: americanas.com.br)


     Fui à livraria do shopping no último final de semana do ano. Na seção de biografias folheei "Rabo de Foguete"(1) - livro do Ferreira Gullar no qual ele conta como foram seus anos de exílio. Enquanto aguardava minha filha, que estava em outra loja, lia um dos capítulos no qual o Gullar descreve, dentre outras coisas, as vezes em que esteve com Vinícius de Moraes na primeira metade dos anos 70, em Buenos Aires. Quis ler o capítulo inteiro ali mas, chamado pela minha filha, descemos para uma cafeteria. Entre um café e outro, fiquei pensando em um daqueles encontros Gullar/Vinícius, e no que eles poderiam ter conversado. O Gullar estava na Argentina por força do destino - e por força do "poder" -, enquanto que o Vinícius fazia apresentações musicais na cidade - com o Toquinho e Maria Creuza. E nessa época eu aqui, como tantos outros ingênuos, sonhava apenas em passar uma "Tarde em Itapuã".

     Voltei do shopping e, em casa,  pela internet, encomendei o livro em um sebo. Ansioso pela sua chegada, guardei a sensação de que estava por receber a visita do Gullar, e que teríamos uma conversa tal qual as que ele havia tido com o Vinícius. 

     Dois dias depois, pelo correio, o livro chegou em casa. Sem necessidade disso, mas involuntariamente assim me colocando, encolhi-me na minha escrivaninha para lê-lo. A sensação era a de estar lendo clandestinamente, nos "anos de chumbo", o "Manifesto Comunista" - tal foi o envolvimento que tive com a leitura. Com o Gullar mudei de apartamento no Rio; vivi clandestinamente na casa de amigos; viajei para a antiga União Soviética; conheci as pessoas de seu relacionamento; voltei para a América do Sul dos anos 70 e acompanhei, nas ruas e pelo rádio, a queda do governo Allende - no Chile. Por fim, após uma difícil passagem pelo Peru, passei com ele pela Argentina e de lá regressamos ao Brasil - onde, antes de sorrirmos ao som de "O bêbado e a equilibrista", fomos submetidos a diversos interrogatórios.

     Minha escrivaninha fica em meu quarto, ao lado de uma porta de vidro que dá para uma sacada, no nono andar de um edifício. Dali, costumo olhar para fora e ver os edifícios da cidade, as luzes dos apartamentos, e a escuridão da noite. Tendo terminado a leitura do livro fiquei olhando para fora e imaginando o que estaria sendo conversado debaixo de cada luzinha que via nos edifícios vizinhos ao meu. Esses pensamentos, somados à leitura que havia terminado, me remeteram à difícil trajetória de vida dos muitos brasileiros exilados. Quanta gente precisou deixar de lado toda a família, trabalho, amigos, "apagar as luzes de casa" e partir para lugares desconhecidos para sobreviverem anonimamente!  Quanto perdemos com essa "página infeliz da nossa história", como dizia o Chico. É triste a memória desse tempo!
  
("Minha escrivaninha fica ao lado de uma porta de vidro que dá para uma sacada" - foto: arq. pessoal)

 
     Essas imagens de gente conversando sobre o país de origem, estando longe dele - no caso, e em especial, na condição de exilado em que se encontrava o Gullar - me despertam para muitas figuras de imaginação. Uma conversa nessas circunstâncias deixa a ideia de confidencialidade e cumplicidade - mas também de idealismo e amor à pátria. Mesmo porque, na Argentina, no Chile, no Uruguai e no Brasil dos anos 70, falar abertamente a respeito de política era prestar uma declaração de lucidez - o que era muito perigoso, naquele tempo. 

     Depois dessa leitura, as crônicas do Ferreira Gullar na "Folha de São Paulo" passaram a ter um maior significado e importância para mim - assim como seus outros livros, que passo agora a procurar.

     Só sei que o ano de 2012 terminou, e levei dele a sensação fantasiosa de ter feito um novo amigo. É interessante isso: mesmo que a gente não saiba, está constantemente nascendo para alguém. E o Ferreira Gullar, aos 82 anos, nasceu para mim depois que li, no final do ano, o livro em que ele conta as memórias de sua vida de exilado: "Rabo de Foguete - os anos de exílio".

("A volta dos exilados políticos: trecho da minissérie 'Queridos Amigos'" - de Maria Adelaide Amaral - TV Globo, 2008 - música: "O Bêbado e a Equilibrista")

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 (1) Gullar, Ferreira. 1930. Rabo de Foguete - os anos de exílio. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Revan, 1998