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segunda-feira, 22 de junho de 2020

INDIFERENÇA


São Paulo, Capital - Foto: arq. pessoal

"Sólo le pido a Dios
que el futuro no me sea indiferente"
(Leon Gieco)

     Albert Camus (1913-1960) foi um escritor e filósofo francês. Nascido na Argélia, então colônia francesa, escreveu vários livros nos quais procurava encontrar um sentido para a vida - ou, em outras palavras, ilustrar, em muitas de suas leituras, o seu sem-sentido [da vida]. "O Estrangeiro"* é um deles.

     Em "O Estrangeiro" Mersault, o personagem principal, é um homem frio. Encarando fatos e a realidade como uma mera sucessão de ocorrências sem sentido e sem consequências significativas, parece estar alheio a tudo o que acontece consigo mesmo e com o próprio mundo. Nada o afeta. É um ser apático, impermeável, anestesiado. Para ele tudo é vazio. Recebe a notícia da morte da mãe e fica indiferente a isso; é aprisionado em virtude de um assassinato banal e isso em nada o modifica; é levado a julgamento e fica indiferente ao seu destino. Mersault é, enfim, a apatia, a negligência, o vazio, o nada: um estrangeiro neste mundo.

     Camus foi o oposto do "estrangeiro" Mersault. Apesar de tuberculoso, escrevendo e editando um jornal clandestino, militou na resistência francesa durante a Segunda Guerra Mundial. Em 1957 foi premiado com o Nobel de literatura.

     Quando ando pelas ruas de minha cidade, fico entristecido ao ver prédios pichados, praças descuidadas, ruas esburacadas, mãos pedintes e faces sofridas. Minha sensação é de desamparo e impotência.

     - "Sou Mersault? Sou Camus?", fico pensando. E volto para casa em pedaços.

     Analisando o sem-sentido da existência vazia de Mersault, o vazio existencial que ela parece provocar, e ainda comparando-a com as buscas e denúncias de Camus, fico pedindo a Deus que mantenha acesa em mim, enquanto eu aqui estiver, a capacidade de sentir, de me emocionar, de me encantar com toda manifestação de vida; que, de alguma forma, eu esteja sempre disposto a agir. Quero que a dor, a morte, a pobreza, a injustiça, o sofrimento dos acamados e o futuro não me sejam indiferentes. Que eu não me deixe simplesmente me arrastar pelo curso da vida sem querer dela participar, sem querer me dar conta do modo com que cada manifestação humana em mim repercute. Que, enfim, eu consiga ter sensibilidade suficiente para recolher, de cada gesto ocorrido em meu caminho, um exemplo e um motivo de inspiração para eu poder me expressar, continuar construindo a mim mesmo, aos que comigo se importam, ao homem como ser atuante, e ao próprio mundo como consequência.

(CLIQUE NA SETA PARA OUVIR
E ACOMPANHAR A LETRA ABAIXO)
(Mercedes Sosa, com part. de León Gieco:"Solo le pido a Diós, de León Gieco)


Solo Le Pido A Dios (Leon Gieco)

Sólo le pido a Dios
Que el dolor no me sea indiferente
Que la reseca muerte no me encuentre
Vacía y sola sin haber hecho lo suficiente

Sólo le pido a Dios
Que lo injusto no me sea indiferente
Que no me abofeteen la otra mejilla
Después que una garra me arañó esta suerte

Sólo le pido a Dios
Que la guerra no me sea indiferente
Es un monstruo grande y pisa fuerte
Toda la pobre inocencia de la gente
Es un monstruo grande y pisa fuerte
Toda la pobre inocencia de la gente

Sólo le pido a Dios
Que el engaño no me sea indiferente
Si un traidor puede más que unos cuantos
Que esos cuantos no lo olviden fácilmente

Sólo le pido a Dios
Que el futuro no me sea indiferente
Desahuciado está el que tiene que marchar
A vivir una cultura diferente

Sólo le pido a Dios
Que la guerra no me sea indiferente
Es un monstruo grande y pisa fuerte
Toda la pobre inocencia de la gente
Es un monstruo grande y pisa fuerte
Toda la pobre inocencia de la gente
Eu Só Peço A Deus

Eu só peço a Deus
Que a dor não me seja indiferente
Que a seca morte não me encontre
Vazio e só sem ter feito o suficiente

Eu só peço a Deus
Que o injusto não me seja indiferente
Que não me esbofeteiem a outra face
Depois que uma garra me arranhou essa sorte

Eu só peço a Deus
Que a guerra não me seja indiferente
É um monstro grande e pisa forte
Em toda pobre inocência desta gente
É um monstro grande e pisa forte
Em toda pobre inocência desta gente

Eu só peço a Deus
Que o engano não me seja indiferente
Se um traidor pode mais que uns muitos
Que estes muitos não o esqueçam facilmente

Eu só peço a Deus
Que o futuro não me seja indiferente
Desenganado é o que tem que fugir
Pra viver uma cultura diferente

Eu só peço a Deus
Que a guerra não me seja indiferente
É um monstro grande e pisa forte
Em toda pobre inocência desta gente
É um monstro grande e pisa forte
Em toda pobre inocência desta gente


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*CAMUS, Albert. O ESTRANGEIRO; tradução de Valerie Rumjanek. 30ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2009 (publicado em 1942, ainda durante a Segunda Guerra Mundial, porém escrito antes dela - de 1936 a 1940).

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